quarta-feira, 25 de janeiro de 2012

Sustentabilidade e a Bíblia

Entrevista concedida à Revista Comunhão em 25 de janeiro de 2012-01-25

1- Como podemos definir sustentabilidade?

Fiquei por muito tempo querendo encontrar uma explicação bem prática sobre este tema. Temos migrado muito no campo da teoria e ainda vemos muitas coisas acontecendo pertinho de nós, mesmo considerando que vivemos numa região do país que tem experimentado um nível excelente de progresso, desenvolvimento e que tem um grande acesso às informações, tanto as que fluem pela mídia quanto as que vêm das nossas escolas. Ainda se joga, por exemplo, muito lixo nas ruas.

Certa vez estive assistindo a um palestrante, um senhor já bastante idoso, que falava histórias sobre o meio ambiente. Num dos pontos de sua ministração ele falou que ‘a sustentabilidade se dá quando tudo aquilo que se extrai da terra, para o consumo, a própria terra se incumbirá, num processo natural, de repor’. Emendando, ele concluiu que não praticamos atos de sustentabilidade quando devolvemos à terra mais do que ela consegue absorver naturalmente’.

Passei a entender melhor coisas relacionadas a ‘consumo consciente’, ‘reciclagem de resíduos domésticos’, ‘coleta coletiva’ etc.Sei que tenho ainda muito mais que aprender e praticar, principalmente quando entendo que posso me tornar modelo para os que estão sob minha influência direta, a começar por meus filhos.

2- Assim como nosso corpo precisa de cuidados por ser o templo do Espírito Santo de Deus, a Terra, criação de Deus precisa deste mesmo cuidado por ser um corpo vivo? Ou são duas coisas diferentes? Por quê?

Gostaria de sinonimar templo, como lugar de habitação para o Espírito Santo, e terra como lugar de habitação para todos os seres vivos, com o vocábulo CASA. O termo ecologia é uma combinação de duas palavras gregas: Oikos Significa casa e Logos significa Estudo. Assim, a palavra ecologia nos remete ao cuidado que todos temos que ter com relação a nossa casa, seja ela a casa que devemos cuidar para nos conduzir, até a nossa morte, da forma mais salutar quanto possível, mas que tem sido designada para habitação do Espírito de Deus em nós; seja ela a casa em que habitamos juntamente com a nossa família, e que deve igualmente ser um lugar aprazível e bem cuidado; daí vamos expandindo o entendimento desta responsabilidade para a nossa Casa-Bairro, Casa-Cidade, Casa-País e Casa-Planeta.

De que adianta trabalhar a ecologia planetária se não cuidamos da ecologia pessoal. Afinal de contas, quem não está sendo fiel ‘no pouco’[Mt 25.23] como conseguirá ser fiel sobre ‘o muito’?

Havemos de considerar apenas que cada nível de Oikos sobre nossa incumbência haverá um nível de cuidado peculiar. Uma boa pergunta que poderíamos fazer é quanto a ‘o que posso fazer para cuidar da minha Casa-corpo para que eu tenha saúde e para que o Espírito Santo habite confortavelmente?’. Esta reflexão pode ser colocada em relação a todos os demais ambientes sob nossa gestão [Oikos-lar, Oikos-bairro, até Oikos-planeta].

 3- De que tipo de atitudes destrutivas nosso corpo e a terra precisam ser preservados? Será que podemos fazer essa correlação?

Quando Adão e Eva transgrediram à ordem divina, foram expulsos do Jardim de Deus porque, estando ali, poderiam, em comendo da Árvore da Vida, tendo adquirido a semente do pecado e estando, agora, sob a liderança de Satanás, contaminar aquela terra. Deus os colocou num outro espaço para que os cardos e os abrolhos não proliferassem ali. O homem transgressor amaldiçoa a terra através dos pecados que comete.

Em II Cr 7.14, que é um fragmento da resposta de Deus a Salomão, lemos que ‘se o povo que se chama pelo nome de Deus se humilhar, orar, buscara a face do Todo-poderoso e se converter de seus maus caminhos, então Deus o ouvirá dos céus, perdoará os seus pecados e sarará a sua terra’. Vemos assim que práticas transgressoras trazem contaminação à terra.

Do ponto-de-vista da Palavra de Deus, a atitude destrutiva da qual devemos nos afastar para que tanto o nosso corpo quanto a terra em que habitamos tenham saúde, e sejam preservados, chama-se PECADO, TRANSGRESSÃO, ou termos afins.

 4- Que efeitos o mau uso da terra causa sobre a humanidade?

Há um texto no livro de Jó que nos faz refletir sobre ‘quem pode numerar com sabedoria as nuvens? Ou os odres dos céus, quem os pode despejar, para que o pó se transforme em massa sólida, e os torrões se apeguem uns aos outros?’. E, ainda: ‘onde está o caminho para a morada da luz? E, quanto às trevas, onde é o seu lugar, para que as conduzas aos seus limites e discirnas as veredas para a sua Oikos?’.

Toda vez que deixamos que os cuidados de Deus venham sobre nós, certamente Ele nos trará o que há de melhor. Quando deixamos que nosso senso de justiça própria, nossos rudimentos de sabedoria humana e a nossa ganância governarem as nossas ações, corremos um grande risco de trazer algum efeito danoso tanto com relação a nós mesmos quanto em relação do planeta.

O apóstolo Paulo perguntou: ‘Quem conheceu os intentos do Senhor? Ou, quem foi seu conselheiro?’

Os textos acima estão em Jó 38 e 39 e Rm 11.33-36.

5- Quais são as passagens bíblicas que determinam ou reforçam nosso dever de preservar a terra?

Segundo o site Wikipedia, o cientista alemão Ernst Haeckel usou pela primeira vez o termo Ecologia, em 1869, para designar o estudo das relações entre os seres vivos e o ambiente em que vivem. Mas, a Palavra de Deus é toda Ecologia.

No site www.chabad.org.br, encontramos, por exemplo, sobre o descanso que os judeus imprimiamà terra. A informação abaixo, extraída do site, está amparada pelos textos do livro bíblico de Levítico [recomendamos Lv 25.4]:

Durante seis anos você semeará o seu campo, e por seis anos podará sua vinha, e colherá sua produção, mas no sétimo ano, a terra deverá ter um completo repouso, um Shabat para o Eterno; você não semeará seu campo, não podará sua vinha, nem colherá os produtos de sua colheita… E [o produto do] Shabat da terra será seu para comer, para seus servos homens e mulheres, e para seu trabalhador contratado e residente que mora com você…’ (Vayicrá 25:3-6).

E, ainda, ‘durante o ano de Shemitá, os moradores da Terra de Israel devem desistir completamente de cultivar seus campos. Eles também abrem mão da propriedade pessoal de seus campos; qualquer produto que crescer por si mesmo é considerado propriedade comunal, livre para qualquer pessoa pegar. Este aspecto do ano Shemitá é conhecido como shmitat karka, ou seja, liberar a terra’.

Mas, eu gosto de destacar a importância do texto de Gn 2.15 em que Deus tomou o homem, colocando-o no Jardim do Éden com a incumbência de cultivá-lo e guardá-lo.

A etimologia da palavra ‘cultivar’ relaciona a sua origem ao verbo latino COLO, que tem o mesmo radical de Cultura e Culto. Ou seja, quando pensamos em cultivar, somos geralmente levados a pensar em agricultura, cuidado com a terra, com a lavoura. Mas se estendermos o entendimento de ‘cultivar’, associando aos conceitos de ‘cultura’ e ‘culto’, vemos que podemos cultivar muito mais coisas do que simplesmente batatas, arroz ou tangerina. Cultivamos conceitos, valores, princípios morais e éticos, cultivamos conhecimento, relacionamentos etc. Pelo fato de que estes verbetes decorrem do mesmo verbo latino que nos arremete para ‘culto’, podemos inferir que nós cultivamos em decorrência daquilo ou de quem prestamos culto. Assim, a forma como cultuamos, ou quem nós cultuamos, poderá determinar o tipo de sociedade que seremos, que projetos, caminhos e destinos serão a nossa preferência, a forma como iremos nos relacionar e tudo o mais. Simplificadamente, a forma como nos relacionamos com Deus em nosso dia-a-dia definirá nossas condutas, toda a nossa forma de viver.

Com relação ao verbo ‘guardar’, está relacionado primeiramente à gestão do Jardim de Deus, uma vez que guardar não significa apenas ficar olhando ou esconder num lugar fora do alcance de intrusos; guardar significa administrar, observar se mantém as condições originais considerando que há de se prestar contas diante daquele que nos incumbiu.

Guardar pode significar ainda, dar manutenção, restaurar a forma ante algum tipo de agressão ou acidente ou, ainda, dano por intempérie etc, promover proteção ante invasão inimiga, contra atos de destruição promovidos por pessoas ou por agentes naturais e, ainda, promover utilidade considerando que as coisas se degradam até mesmo por falta de uso. A questão da utilidade deve ser ordenada para que não haja alterações que corrompam as condições originais.

6- Maltratar a criação, os animais é um ato de rebeldia ou desobediência a Deus?

Se Deus, à luz de Gn 2.15, nos comissiona a cultivar e guardar, qualquer atitude que corrompa os princípios relacionados ao cuidado e à guarda constituem decisões distintas das orientações divinas. É bem verdade que não podemos nos esquecer  daquilo que a própria Palavra de Deus nos ensina com relação aquilo que deve ser tomado para nosso alimento, para o nosso sustento.

7- O que o crentes devem fazer no dia-a-dia para preservar a terra e seus recursos naturais?

Há muito a ser feito, desde a tão necessária transformação do nosso entendimento,conforme Rm 12.1-2, acerca de todas as coisas, até às práticas mais primárias como economias de luz e água consumidas domesticamente, a questão do lixo que ainda jogamos nas vias públicas etc.

Um bom começo é voltar aos paradigmas divinos através da leitura da Palavra de Deus. Uma boa leitura permanente é o Livro de Provérbios.

Chega daquela sujeira que muitos de nós temos deixamos no templo da igreja. São copinhos de água, pedaços de papel. Isto reflete o que fazemos do lado de fora.

Mas, há um rol de ações sociais bem simples que aprendemos do ex-Vice Presidente dos Estados Unidos, o Sr. Al Gore. Em seu site www.climatecrisis.net ele deixou doze dicas:

1.       Troque a lâmpada incandescente para lâmpada fluorescente

2.       Use menos o seu automóvel

3.       Pratique mais a reciclagem de materiais e alimentos

4.       Mantenha correta a calibragem dos pneus de seu automóvel

5.       Use menos água quente, sobretudo durante o banho

6.       Evite levar embalagens para casa [depois você terá que jogar fora, gerando lixo]

7.       Ajuste o termostato do seu aquecedor ou condicionador de ar

8.       Plante uma árvore

9.       Desligue completamente os aparelhos eletrônicos, principalmente à noite ou ao sair de casa

10.   Não coma carne em um dos dias de semana

11.   Desplugue-se. Biblicamente falando, descanse no Senhor; não fique ansioso[a]

12.   Encoraje seus amigos a praticarem isto como você.

8- É papel da igreja lutar e praticar a preservação da natureza? O que tem sido feito pelo povo de Deus neste sentido?

À luz de tudo o que foi dito acima, é muito mais papel da igreja pelo que representa em sua relação com o Senhor, o Criador, do que papel do mundo. No entanto, vejo muito mais ações no mundo secular do que nas próprias organizações cristãs. Muitas vezes vemos que nossos diálogos e ações denotam uma ‘capa espiritual’ que impedem que debatamos temáticas sociais, ainda que revelem o caráter cristão embutido na vida da terra.

Bem recentemente a igreja começou a discutir o posicionamento cristão ante os Sete Pilares da Sociedade. É isso mesmo que precisamos fazer; ocupar o papel de profetas, filhos e filhas de Deus com o papel de redimir, de efetuar a redenção de uma terra contaminada. Nosso chamado é para que sejamos imitadores de Paulo assim como ele o era em relação a Jesus.

Quando caminharmos pela senda da presenvação, cultivando e guardando, muitos nos seguirão e, aí sim, poderemos oferecer a nós mesmos e às futuras gerações um ambiente melhor do que nos legaram os nossos pais.

9- Como manter a viabilidade do planeta para as futuras gerações?

Cultivando-o e guardando-o. Afinal de contas, tenho os meus sessenta anos e não pretendo ‘bater as botas’ tão cedo. Assim, gostaria de estar numa terra melhor juntamente com as futuras gerações, se assim Deus o quiser.

10- Pequenas atitudes e muita consciência vão fazer a diferença?

Sim, mas gostaria de mudar a ordem: muita consciência [transformação de mente – Rm 12.1-2] e pequenas atitudes, apenas para começar; temos que caminhar num mover crescente de atitudes ambienta e biblicamente corretas.

11- Como podemos cultivar a sustentabilidade em casa, na igreja e onde quer que o crente vá?

Gostaria de responder de uma forma muito singela. Há um livro que, apenas pelo seu título já dá para responder à pergunta sobre o que devemos fazer pela sustentabilidade. O nome do livro é ‘Em Seus Passos o que Faria Jesus?’, que foi escrito por Charles Sheldon e publicado nos Estados Unidos em 1896 com o título ‘In His Steps’.

12- Preservar é uma contribuição que reflete obediência aos princípios bíblicos?

Sim.

13- Fale um pouco sobre as últimas noticias (se houver) a respeito da camada de ozônio, poluição, clima, mares, espécies, fauna, flora, que possam contribuir para nos atualizar sobre as condições do nosso planeta.

Há um ano vivenciamos uma grande tragédia muito perto de nós. A Região Serrana do Estado do Rio de Janeiro experimentou um grande desastre ecológico que ceifou as vidas de muitos brasileiros. No mesmo ano assistimos ao tsunami que varreu parte do Japão promovendo uma grande comoção e debate planetário sobre o que fazer com as Usinas Atômicas.

Sempre achamos que podemos fazer algo em relação a usinas atômicas, mas pouco há que se possa fazer quando a natureza reage ao tanto que nós lhe impomos de devastação e mau uso.

As atitudes que a sociedade japonesa e seu governo investiram naquela experiência são exemplares. Ainda hoje muitos vivem desassistidos tanto em Petrópolis, Teresópolis e Friburgo, quanto no Morro do Bumba, em Niterói, pelo deslocamento de terra em um antigo lixão que culminou com muitas mortes, além de outros prejuízos.

Precisamos deixar de ser uma sociedade passiva e reativa apenas ante às tragédias, mas uma sociedade que vê, considera, se organiza e age, sobretudo preventivamente e responsavelmente, livre dos interesses de politiqueiros corruptos que querem viver à custa da miséria alheia.

Há muita informação disponível na mídia televisiva e também na internet. Precisamos fazer as leituras certas. Recomendo o site http://colunas.revistaepoca.globo.com/planeta/.

14- Com relação aos relacionamentos entre as pessoas, em que isso afeta favoravelmente o nosso planeta?

A gestão do planeta, afora as questões leis naturais, dos ordenamentos do Criador, está nas mãos dos homens. Na medida em que esses homens se aliam responsavelmente em administrar as polis e o meio ambiente, o resultado será bem diferente daquele grupo de gestores que desviam o dinheiro público destinado ao cuidado das vítimas de danos naturais para enriquecimento ilícito. Quando os relacionamentos se formam sobre a base da ética, dos valores morais e da fé pura, focados na construção de uma sociedade feliz e saudável, certamente influenciarão positivamente nas questões planetárias, tanto ambientalmente quanto aos demais fatores inerentes como política, comércio e tudo o mais. Aliás, esse era o projeto original de Deus para os homens.

15- E a questão ética do comandante que abandonou o navio que afundou? É tb falta de ética maltratar a criação de Deus. Por quê?

O capitão ‘pulou fora do barco’. ‘Pular fora do barco’ é o mesmo que dizer que abriu mão da sua responsabilidade. Nesse caso a ética profissional do capitão preconizava que ele permanecesse a bordo até que o último tripulante houvesse sido salvo, sendo ele a última pessoa a sair. Quando temos uma responsabilidade que é só nossa, foi entregue em nossas mãos, inclusive a de bem cuidar da criação divina, e fugimos dela, ‘pulamos para fora do barco’ estamos deixando de cumprir com o nosso compromisso social e isso é também uma questão de ética.

16- Pastor, fale do seu trabalho, formação, igreja e, se possível, cite um exemplo positivo de atitude de alguém que possa servir de ilustração para a matéria.

Tenho sessenta anos de idade e sou administrador de empresas. Desde 1978 tenho dividido a minha vida em atividades cristãs e atividades em organizações empresariais. Tenho estado sob a liderança do apóstolo Ozenir Correia e me dedicado à investigação bíblica, o que me tem levado a escrever alguns materiais. Há dois livros em fase de conclusão: ‘Revisão do Caráter em 30 Dias’ e ‘Há Caminho...’. Tão logo se concluam as revisões serão encaminhados às publicadoras. Há um terceiro livro em andamento: ‘A Porca Lavada’, que tratará da questão daqueles que estão desviados mesmo dentro de suas congregações, pessoas que têm vivido abaixo da expectativa, sua mesmo e de Deus.

Estou com um curso – ‘Aprofundamento Bíblico’ – em parceria com o SECRAI, do meu amigo e pastor Alcione Emerich. Este curso será ministrado em dois módulos, sendo um em cada semestre deste ano de 2012. Um dos temas será sobre a ‘Mordomia da Criação’ onde serão abordadas as questões do relacionamento do Cristão com o Meio Ambiente à luz da Palavra de Deus. Aos interessados, indico o site do SECRAI: www.secrai.com.br. [Gostaria muito se vocês pudessem divulgar esta parte].

17- Gostaria de sugerir outras fontes para esta entrevista?

Seria muito bom se vocês pudesse fazer um contato e solicitar um texto da nossa irmã Marina Silva.

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